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domingo, 12 de agosto de 2012

Pai




São tantas as definições fora da simples palavra-dicionário. Há o pai presente, o omisso, o desconhecido. Há o pai dos sonhos, pai amigo, pai-avô, pai super-herói... Há pai de todo tipo. Cada filho ou filha tem sua definição para o pai que tem, para o pai que não teve, para o pai que desejaria ter, para o pai que sempre terá.

 O meu pai já partiu desse mundo, mas nunca partiu de mim. Ainda na adolescência, escrevi uns versos para defini-lo. De tempos em tempos, até lapido um verso ou outro, mudo o estilo da escrita, mas a essência permanece a mesma. Se hoje meu pai estivesse aqui, eu leria outra vez esse poema para ele. E depois conversaríamos longamente sobre as histórias das entrelinhas. E eu me emocionaria outra vez ao sentir a doce lágrima brotando daquele meigo olhar, orvalhando o riso sereno do seu semblante e envolvendo meu ser inteiro com seu amor incondicional.

E porque meu pai nunca partiu de mim, releio o poema outra vez. De alguma forma, ele sempre me escuta quando ouço em minha lembrança a sinfonia do vento embalando a dança dos trigais dourados. Outras vezes, ele me ouve quando olho as estrelas e a Lua, silenciosamente, como ele e eu as comtemplávamos juntos nas noites e madrugadas da minha infância...


 viagem

                                        ao meu pai Aristides

tantas vezes embarco no trem da lembrança
desembarco na estação da infância
transbordo-me numa saudade insólita
vera vontade de ser em tudo
apenas uma criança


de muito no mundo
melhor seria
nunca ter
tanta ciência

ah! embarcar no trem da lembrança
fugir do tempo-vento-desalento
rolar na grama do tempo antigo
adormecer em teus braços cansados
fitar em teu rosto fatigado
a paz do teu silêncio amigo

correr pelas manhãs tão madrugadas
sentindo em minha mão pequena
a tua mão áspera e calejada
caminhar nos caminhos antes do sol
pisando a erva orvalhada
escutar teus passos descalços
traçando um digno destino
no sonho suado de cada jornada

tantas vezes embarco no trem da lembrança
tento seguir-te na minha viagem
busco tua força
tua doce alegria
tua sempre-coragem
de renascer a cada dia

aprendo a decifrar tuas humildes palavras
tão repletas de sabedoria
ah! tanto eu queria seguir teu caminho
ser um pouco a tua bagagem
mas perdoa
meus tropeços
meus espinhos
se eu me perco dos teus rastros
quando embarco sem destino
no barco louco dos meus desatinos


*Versos do poema Viagem - publicado, originalmente, em 1985 e ilustrado em cartão/poema em 1996.

2 comentários:

  1. Oi Lechuza...muito obrigado por tua poesía. Eu agora estou distanciado de meu pái y este texto "saudoso" me tocó especialmente.Muito obrigado. Placer conhecerte. (perdón meu portunhol) Abrazo. Lucio

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  2. Olá, Lúcio!

    Obrigada por ler o poema e expressar sua emoção/sentimento.

    Abraço,

    Lechuza

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